sexta-feira, 11 de março de 2011

CARNAVAL DE PORTO ALEGRE/RS

PORTO ALEGRE OU PORTO SECO?

Clóvis Oliveira*

Terminou o Carnaval e fiquei com a impressão de que nem iniciou. Andei pelas ruas de Porto Alegre durante os feriados, e não vi nada que me lembrasse a sua existência. Parecia um feriado qualquer.
O Carnaval não me motiva, mas sempre gostei da movimentação festiva presente nas ruas da cidade e de ver os participantes das escolas de samba andando pelas ruas centrais com as suas fantasias, depois de desfilar.
Este ano, nem mesmo a Muamba foi realizada no Centro. Que diferença com o Carnaval do Rio de Janeiro e Recife, com os seus massivos blocos populares, tão marcantes na vida daquelas cidades.
Mesmo sabendo que o Carnaval costuma acontecer em algum dia mal divulgado na Cidade Baixa, é no Porto Seco que desfilam as escolas de samba, e foi lá que a minha preferida, a Restinga ganhou. Chamo uma das minhas gatas de “Tinga”, em homenagem ao bairro e ao jogador do Internacional. Mas esta simpatia pelo Carnaval não me impede de ver que o desfile das escolas de samba deixou de ser um fato social, cuja influência atingia toda a cidade e todas as classes sociais, e acabou escondido e confinado em um gueto distante.
Sem desrespeitar aqueles que gostam de ir ao Porto Seco, o fato é que, ao desaparecer das áreas centrais, o Carnaval perdeu legitimidade ante o conjunto da população da cidade.
Alguns anos atrás, quando foi sugerido que o desfile das escolas de samba fosse deslocado para a região do Parque Marinha, houve uma reação contrária de cunho elitista e, sem que tivesse sido discutidas outras alternativas, o Carnaval foi mandado para o Porto Seco.
Melhor seria que tivesse permanecido na região do Parque da Harmonia/Maurício Sirotsky Sobrinho, onde esteve durante muitos anos. Autoridades disseram que atrapalhava o trânsito, mas ninguém questionou a presença do Acampamento Farroupilha na mesma área. Nada contra o tradicionalismo e o acampamento, que têm a minha simpatia, mas porque o Carnaval não podia também permanecer ali?
Sempre me perguntei por que os “carnavalescos” das escolas de samba concordaram com a proposta da Prefeitura Municipal (na época administrada pelo PT, logo um partido surgido a partir dos movimentos populares) de levar o Carnaval para fora do Centro e de confiná-lo no gueto do Porto Seco. Como puderam ser coniventes com esta proposta elitista?
Nada me tira da cabeça que o Carnaval, uma festa que conta com a participação popular e, particularmente do povo negro, foi vítima de discriminação quando foi posto para fora da área central de Porto Alegre.

* Professor de História

Artigo publicado no jornal Zero Hora, de Porto Alegre, 11/03/2011

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