Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/carreira/avaliacao-docente-todos-olho-professor-608078.shtml
Para que a prática ajude a ensinar melhor, é preciso desenvolver um sistema que vá além da aplicação de provas
Avaliar, avaliar, avaliar. De alguns anos para cá, a prática tem se tornado um tema recorrente no mundo da Educação. Países criam complexos sistemas de medição, juntas de especialistas estabelecem padrões e faixas de desempenho, organismos internacionais desenvolvem testes para comparar resultados em todo o mundo. No Brasil, uma das novidades foi a instituição de um Exame Nacional de Ingresso na Carreira Docente. Previsto para ser aplicado a partir de 2011, vai medir os conhecimentos dos que querem se dedicar ao Magistério. O atrativo é grande: municípios e estados podem aderir à iniciativa, considerando-a um componente da nota dos concursos ou mesmo substituta dela.
A ideia é interessante. No início da docência, a avaliação é fundamental para verificar se o candidato cumpre os requisitos de entrada na profissão. Durante a carreira, ajuda a indicar o que está bom e, principalmente, o que deve ser aperfeiçoado. Mas não basta aplicar uma prova e achar que o problema está resolvido. Se desejamos que o processo ajude o docente a ensinar melhor, é preciso dar um passo atrás e perguntar: o que é mesmo que estamos avaliando?
A resposta requer reflexão sobre o que significa ser um bom professor. É aquele cujos alunos só tiram dez? O que tem uma formação recheada de cursos? Quem se dá bem com colegas e funcionários? Ou tudo isso junto (e muito mais)? Para produzir os Referenciais para o Exame Nacional de Ingresso na Carreira Docente, o Ministério da Educação (MEC) compilou pesquisas de padrões docentes em sete países. Chegou a uma lista com 20 características do perfil do professor ideal (conheça algumas delas no quadro da página seguinte).
Além da constatação de que exercer o Magistério não é nada fácil, percebe-se que muitos aspectos não podem ser aferidos por provas. Como elaborar uma questão para certificar se o profissional "estabelece um clima favorável à aprendizagem?". Ou se demonstra "valores, atitudes e comportamentos positivos?". Os especialistas na área (e o próprio MEC, faça-se justiça) reconhecem essa impossibilidade. Ao realizar uma sondagem comparativa sobre a avaliação de professores em diversas nações, a uruguaia Denise Vaillant, coordenadora do Programa de Desenvolvimento Profissional Docente na América Latina e Caribe (Preal), concluiu que os sistemas de sucesso apostam na combinação de múltiplas estratégias, como a avaliação pelos pares e pelos gestores das escolas e a autoavaliação. As provas são apenas uma parte do cardápio - e, muitas vezes, não a mais importante.
No Brasil, ainda precisamos construir essa estrutura de avaliação múltipla. A esperança é de que a prova seja apenas o primeiro tijolo, ao qual se somem outros tipos de aferição. Para chegar lá, uma primeira providência é apostar na formação de bons avaliadores. Aqui, os programas de formação têm um papel importante, já que o assunto costuma ser pouco contemplado tanto nos currículos de graduação como na formação em serviço. Esse conhecimento é a base de sistemas como o australiano, em que cada ciclo de avaliação dura dois anos e compreende planejamento (para definir o foco do trabalho), coleta de dados (para aferir a qualidade do ensino e projetar objetivos de evolução, que variam de acordo com o nível do desenvolvimento profissional de cada um, dos principiantes aos mais experientes) e acompanhamento (para avaliar o auxílio oferecido e o avanço na obtenção das metas).
Um segundo passo é estabelecer a participação dos avaliados na definição de critérios e metas. Isso é fundamental para que o corpo docente apoie a avaliação, encarando-a como uma oportunidade pedagógica e não como uma ameaça.
A ideia é interessante. No início da docência, a avaliação é fundamental para verificar se o candidato cumpre os requisitos de entrada na profissão. Durante a carreira, ajuda a indicar o que está bom e, principalmente, o que deve ser aperfeiçoado. Mas não basta aplicar uma prova e achar que o problema está resolvido. Se desejamos que o processo ajude o docente a ensinar melhor, é preciso dar um passo atrás e perguntar: o que é mesmo que estamos avaliando?
A resposta requer reflexão sobre o que significa ser um bom professor. É aquele cujos alunos só tiram dez? O que tem uma formação recheada de cursos? Quem se dá bem com colegas e funcionários? Ou tudo isso junto (e muito mais)? Para produzir os Referenciais para o Exame Nacional de Ingresso na Carreira Docente, o Ministério da Educação (MEC) compilou pesquisas de padrões docentes em sete países. Chegou a uma lista com 20 características do perfil do professor ideal (conheça algumas delas no quadro da página seguinte).
Além da constatação de que exercer o Magistério não é nada fácil, percebe-se que muitos aspectos não podem ser aferidos por provas. Como elaborar uma questão para certificar se o profissional "estabelece um clima favorável à aprendizagem?". Ou se demonstra "valores, atitudes e comportamentos positivos?". Os especialistas na área (e o próprio MEC, faça-se justiça) reconhecem essa impossibilidade. Ao realizar uma sondagem comparativa sobre a avaliação de professores em diversas nações, a uruguaia Denise Vaillant, coordenadora do Programa de Desenvolvimento Profissional Docente na América Latina e Caribe (Preal), concluiu que os sistemas de sucesso apostam na combinação de múltiplas estratégias, como a avaliação pelos pares e pelos gestores das escolas e a autoavaliação. As provas são apenas uma parte do cardápio - e, muitas vezes, não a mais importante.
No Brasil, ainda precisamos construir essa estrutura de avaliação múltipla. A esperança é de que a prova seja apenas o primeiro tijolo, ao qual se somem outros tipos de aferição. Para chegar lá, uma primeira providência é apostar na formação de bons avaliadores. Aqui, os programas de formação têm um papel importante, já que o assunto costuma ser pouco contemplado tanto nos currículos de graduação como na formação em serviço. Esse conhecimento é a base de sistemas como o australiano, em que cada ciclo de avaliação dura dois anos e compreende planejamento (para definir o foco do trabalho), coleta de dados (para aferir a qualidade do ensino e projetar objetivos de evolução, que variam de acordo com o nível do desenvolvimento profissional de cada um, dos principiantes aos mais experientes) e acompanhamento (para avaliar o auxílio oferecido e o avanço na obtenção das metas).
Um segundo passo é estabelecer a participação dos avaliados na definição de critérios e metas. Isso é fundamental para que o corpo docente apoie a avaliação, encarando-a como uma oportunidade pedagógica e não como uma ameaça.
Avaliação docente e plano de carreira devem caminhar juntos
Equacionados o "que" e o "como" avaliar, chega a hora de pensar no que fazer com os resultados da avaliação. É preciso ter atenção especial aos dois extremos do estrato: os educadores que se saem mal e os com performances excelentes. Comecemos pelos que menos se destacam. A constatação óbvia - a de que esses profissionais precisam de ajuda para evoluir - não tem sido acompanhada de atitudes práticas nessa direção. Muitas vezes, se diz que o ideal seria eliminar os piores automaticamente, mas isso está mais para uma medida extrema, não deve ser a primeira atitude.
Novamente, o caso australiano pode servir de base. Por lá, docentes com desempenho ruim têm a chance de passar por um plano de melhora, elaborado com o coordenador ou o diretor da escola. Durante um ano, o educador recebe o auxílio de um mentor (geralmente, um colega com ótimos resultados), incorporando conhecimentos e aprendendo novas práticas de ensino. Se mesmo após esse período persistir a baixa qualidade, aí, sim, ele deixa de lecionar - mas raramente abandona a escola: pode, por exemplo, passar a exercer funções administrativas na instituição.
Também é preciso considerar o topo da pirâmide. Nesse ponto, fica claro que a boa avaliação docente precisa caminhar de braços dados com a estruturação de um plano de carreira no Magistério. No Brasil, a progressão é burocrática, derivada quase exclusivamente do tempo de serviço ou da titulação - e, pior, estimula a fuga da sala de aula. Para muitos, virar coordenador ou diretor é o único caminho para um salário mais alto. Incentivar professores a assumir mais responsabilidades nas escolas é uma saída que deu certo em Cingapura, na Inglaterra e em estados brasileiros, como o Ceará, onde docentes de destaque são convidados a trabalhar como formadores de seus pares em metade da carga horária. Esses e outros exemplos mostram que uma avaliação por múltiplos caminhos, que privilegie a formação inicial e continuada, que contemple o diálogo entre todos os envolvidos e que esteja atrelada à evolução na carreira, tem chances mais concretas de fazer a Educação avançar. Já a prova, sozinha...
Equacionados o "que" e o "como" avaliar, chega a hora de pensar no que fazer com os resultados da avaliação. É preciso ter atenção especial aos dois extremos do estrato: os educadores que se saem mal e os com performances excelentes. Comecemos pelos que menos se destacam. A constatação óbvia - a de que esses profissionais precisam de ajuda para evoluir - não tem sido acompanhada de atitudes práticas nessa direção. Muitas vezes, se diz que o ideal seria eliminar os piores automaticamente, mas isso está mais para uma medida extrema, não deve ser a primeira atitude.
Novamente, o caso australiano pode servir de base. Por lá, docentes com desempenho ruim têm a chance de passar por um plano de melhora, elaborado com o coordenador ou o diretor da escola. Durante um ano, o educador recebe o auxílio de um mentor (geralmente, um colega com ótimos resultados), incorporando conhecimentos e aprendendo novas práticas de ensino. Se mesmo após esse período persistir a baixa qualidade, aí, sim, ele deixa de lecionar - mas raramente abandona a escola: pode, por exemplo, passar a exercer funções administrativas na instituição.
Também é preciso considerar o topo da pirâmide. Nesse ponto, fica claro que a boa avaliação docente precisa caminhar de braços dados com a estruturação de um plano de carreira no Magistério. No Brasil, a progressão é burocrática, derivada quase exclusivamente do tempo de serviço ou da titulação - e, pior, estimula a fuga da sala de aula. Para muitos, virar coordenador ou diretor é o único caminho para um salário mais alto. Incentivar professores a assumir mais responsabilidades nas escolas é uma saída que deu certo em Cingapura, na Inglaterra e em estados brasileiros, como o Ceará, onde docentes de destaque são convidados a trabalhar como formadores de seus pares em metade da carga horária. Esses e outros exemplos mostram que uma avaliação por múltiplos caminhos, que privilegie a formação inicial e continuada, que contemple o diálogo entre todos os envolvidos e que esteja atrelada à evolução na carreira, tem chances mais concretas de fazer a Educação avançar. Já a prova, sozinha...
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