"A
Corte da Magnólia Brasil em Terras Cuyabanezas"
INTRODUÇÃO
Muito prazer, sou cuiabano.
“A cultura é a soma dos comportamentos, saberes,
técnicas, conhecimentos e valores acumulados pelos indivíduos durante suas
vidas e, em uma outra escala, pelo conjunto dos grupos de que fazem parte. A
cultura é uma herança transmitida de uma geração a outra. (...).” (Claval
-1999:63)
Para este Carnaval de 2019, a Magnólia Brasil resolveu
homenagear os trezentos anos da Capital de Mato Grosso, Cuiabá, através de seu
povo, sua arte, sua cultura e suas belezas naturais.
Cidade localizada no Centro da América do Sul, marcada
pelo Centro Geodésico, é conhecida como Cidade Verde. Porém, ao chegar à
cidade, se descobre mais que o verde, o colorido de seu povo estampados nas
roupas do Cururu e Siriri, na sua arte, no artesanato e no seu jeito alegre de
viver.
A Corte da Magnólia Brasil nada mais é que a Corte do
Carnaval, que à velocidade do samba faz uma viagem à cidade aniversariante e
chega em meio a uma festa, no Bairro de São Gonçalo Beira Rio, onde nasceu
Cuiabá.
Esse berço da cultura e das tradições cuiabanas, hoje,
abriga pouco mais de trezentas pessoas, descendentes diretos dos primeiros
habitantes da região. Os bandeirantes que ali chegaram, foram com o propósito
de capturarem índios para o serviço escravo, principalmente Payaguás, Bororos e
Caxiponés, mas logo encontraram o ouro e ali se instalaram, definitivamente,
marcados como os primeiros Cuyabaneses no século XVIII, mais precisamente 1719.
Após a corrida do ouro, Cuiabá se isolou do resto do
Brasil, o que fez com que sua cultura e seu jeito de viver não sofressem tanto
com as interferências externas. Esse isolamento foi extremamente importante
para se manter tradições e comportamentos culturais perdidos ao longo dos anos
no resto do país, como o Cururu e o Siriri, por exemplo.
Pretendemos, com este desfile, configurar-nos como a
alma e o espírito cuiabano, vestidos das cores de seu povo, de sua arte e de
sua cultura.
A homenagem aos trezentos anos de Cuiabá, aqui
representada pelo jeito cuiabano de ser, se encerra com o retorno da Corte da Magnólia
Brasil à Niteroí, onde também ocorre uma festa, a maior da cidade, os desfiles
das Escolas de Samba, a ópera popular que nos permite fazer viagens em poucos
minutos, à velocidade do samba.
Parabéns, Cuiabá!
SINOPSE
A Corte Carnavalesca da Magnólia Brasil faz uma viagem a
velocidade do samba, e entre pompons multicores, chega ao Centro Geodésico da
América do Sul, onde se avista melhor o Cruzeiro do Sul, que neste ano de 2019,
completa trezentas purpurinas.
Ao som da Viola de Cocho, do Mocho e Ganzá, num
estridente e acelerante toque musical, a Corte da Magnólia chega ao bairro de
São Gonçalo Beira Rio, onde nasceu Cuiabá, local marcado pra festança, e é
recebida pelo seu povo hospitaleiro e festeiro, de rebuça e chuça, que tem nas
veias uma cultura forte e única, e que se propõe a contar parte de sua própria
história, sua cultura e suas origens.
Cuiabá do rio... do rio de mesmo nome que corta e
alimenta de vida a Cidade Verde. A Corte carnavalizada depara-se, não só com o
verde, mas com o colorido mágico do seu povo, de sua arte e de sua natureza,
cidade Portal do Pantanal Matogrossense.
O tecido estampado, a chita, o pano que absorve a tinta,
a tinta que invade as telas dos artistas. Telas que refletem a natureza, o dia
a dia do seu povo e sua alma multicolorida. A Cidade Verde, na verdade, é
Cidade de Todas as Cores.
Sou chique com minha chita
Sou chique com meu chitão
Temos fitas coloridas
Enfeitando a tradição...
Quem disse que a chita não é chique?
Quem disse que ela não tem seu valor?
Misture com fitas. Que vai dar o esplendor.
Aves bailam em revoadas “arlequinadas”, recepcionando
colombinas apaixonadas por pierrôs, que se deparam com as cores vivas e fortes
da natureza, e que inspiram as misturas das tintas, dos artistas da terra.
Tuiuius frenéticos são embalados pelo samba, e que logo se rendem as passadas
rápidas do Siriri, ou compassadas do Cururu, do seu povo em festa. Êta póvo que
gosta de um rebuça e chuça! “Sô arroz de festa, memo, e comadre sinhá sabe
disso”. Tenho dito.
Onças e lobos guarás rosnam em comemoração, jacarés
invadem a água do rio, colibris em revoadas recebem a Corte Carnavalesca,
enquanto pirilampos se preparam pra “alumeiar” a festança, durante à noite.
Kuayaverá , Cuyaverá , Cuiavá, Cuiabá. Os Payaguás,
Bororos e Coxiponés navegavam pelos rios, Cuiabá e Coxipó, rio abaixo e rio
acima. Os bandeirantes queriam destiná-los ao cativeiro, mas acharam ouro no
Coxipó e ali se instalaram. Em 1719, com a bandeira de Pascoal Moreira Cabral,
fundou-se o Arraial da Forquilha, na localidade São Gonçalo Velho, onde o
Coxipó deságua no Cuiabá.
“Limitando qual novo colosso
O ocidente do imenso Brasil
Eis aqui, sempre em flor, Mato Grosso
Nosso berço glorioso e gentil.
Eis a Terra de minas faiscantes
Eldorado como outro não há
Que o valor de imortais bandeirantes
Conquistou ao feroz Payaguás.
... Salve Terra de amor, Terra de ouro
Que sonhara Moreira Cabral
Chova o céu dos teus dons o tesouro
Sobre ti, bela terra natal...”
(Trecho do Hino de Mato Grosso)
Como quase tudo se acaba, a corrida do ouro chegou ao
fim, e a Verde Capital do velho oeste brasileiro teve que resistir a longos
anos de solidão e isolamento.
O isolamento fez com que seu povo e sua cultura fossem
preservados, diferentemente dos outros brasis. A sandália arrastando no chão,
levantando a poeira e tingindo a chita de barro. Com movimentos rápidos,
balançando a saia, o Siriri ganha outro tom, enquanto, Cururueiros em círculo,
rimam toadas zombeteiras da mulher do vizinho.
É assim até hoje. De São Gonçalo Velho passou a se
chamar de São Gonçalo Beira Rio. Aqui, nasceu Cuiabá, e seu povo carrega na
alma e no sangue, a cultura de seus ancestrais.
Entre igarapés, hoje, canoas e barcos não são dos
índios, mas dos pescadores ribeirinhos, que alimentam a cidade. O ouro mais
precioso é sua gente, sua Terra, sua cultura. O dourado do sol, que aquece essa
Terra o ano inteiro, brilha nos olhos dos seus filhos, de tchapa e cruz, como o
ouro da alma.
Do barro que mancha a chita , os ribeirinhos fazem sua
arte. O forno aquece cumbucas, tigelas, figuras humanas, aves... Cerâmica
artesanal, do barro que sai do rio.
A fé move esse povo, que não desiste nunca de viver e
ser feliz, mesmo com muito pouco. O pouco é muito para os que amam a vida e a
liberdade do seu lugar. Salve Bom Jesus de Cuiabá, nosso Padroeiro. Salve São
Benedito, nosso Santo maior. Salve São Gonçalo, Nossa Senhora Aparecida, salve
Santo Antônio, São Pedro e São João. Romeiros surgem de todas as partes, com
preces e louvores, pedindo bênçãos a todos os seus. Rogai por nós!
Benzedeiras espalham e espantam o mal olhado, dançando o
ritmo acelerante e disseminando o bem. Em seus movimentos de benzeduras,
bendizem com palavras de fé e esperança, enquanto, em outro canto, parteiras
dão a luz a um novo ser, mais um Tchapa e Cruz.
A festa continua! Queima lenha no tacuru e bota a panela
pra ferver. Vote! Coisa boa é a comida da morena. Moreninha linda, do meu bem
querer...
... A sua culinária
Todos vão querê prová
Paçoca, bolo de arroz
Francisquito e guaraná...
...Tem farofa de banana
Doce em compota e pixé
Tem mujica de pintado
Pequi e maria izabé...
Ao som da viola de cocho, cururueiros empinam o ganzá de
taquara e batem no mocho de couro de boi, entoando versos zombeteiros numa
batalha de rimas. É o Cururu malandramente, se mostrando pro samba carioca.
Casais dançam enquanto cantores e músicos lançam toadas
aceleradas, louvando o Siriri de pé no chão.
Bendito isolamento territorial, que fez com que essa
dança típica, composta por elementos indígenas, africanos, portugueses e
espanhóis, com variadas evoluções, não se perdesse nesse canto de Brasil. São
trezentos anos de resistência e existência, desde os fundos dos quintais, das
festas em sítios e fazendas, às festas santas nas Igrejas Católicas, para a
perpetuação dessa tradição única, que só restou em um local único. Cuiabá.
O saranzal e a chimbuva
Plantas de grande colosso
Que faz o som da nossa dança
E a viola de cocho
O couro que nos fornece
Para fabricar o mocho
Vem do boi ou vem da vaca
Mas só quando o bicho é morto
A taquara é estridente
Quando ela é rachada
De nó em nó faz o ganzá
Que anima essa moçada...
Mas se preferir, pode convidar a morena pra dançar um
rasquedo e levantar poeira do salão. A tal moreninha linda do meu bem querer!
Parabéns São Gonçalo Beira Rio, parabéns Cuiabá, pelos
trezentos anos de vida. Que seu povo nunca perca a doçura, a alegria, a energia
e o bem viver. Que suas belezas naturais sejam eternamente preservadas, e que
seu povo seja eternamente feliz.
A Festa acaba e a Corte da Magnólia Brasil se despede da
Cidade Verde, e a velocidade do samba retorna pra Niterói, Cidade Sorriso, e
que também está em festa. É carnaval...
Anotações relevantes:
Centro Geodésico da América do Sul:
Demarcado pela Comissão Rondon, em 1909, o centro
geodésico da América do Sul fica no antigo campo do Ourique - hoje a Praça
Moreira Cabral, onde também fica a Câmara Municipal de Vereadores. O local já
foi uma praça de enforcamento de condenados e também um campo de touradas.
Estridente e acelerante toque musical:
O Siriri tem um ritmo bastante acelerado, acompanhados
pelo som da viola de cocho, ganzá e do estridente mocho.
Rebuça e chuça:
Refere-se ao cuiabano, povo festeiro e gosta muito de
dançar. Chamar uma pessoa pro rebuça e chuça, é o mesmo que chamar para a
balada ou para dançar.
Sô arroz de festa, memo, e comadre sinhá sabe disso:
Expressões cuiabanas, onde o termo comadre é bastante
usado. O cuiabano não é de perder nenhuma festa a que tenha sido convidado.
Adora “festá”.
Alumiar:
Iluminar.
Vote:
Expressão de espanto. Dependendo da intonação, pode
significar algo positivo como negativo. Podemos fazer uma equivalência com:
Nossa!
Tchapa e Cruz:
Indivíduo que nasce em Cuiabá, onde no passado recebia
uma chapa de alumínio no pulso, e morre em Cuiabá, recebendo a cruz. Ou seja:
cuiabano que nasce e morre em Cuiabá.
Tacuru:
Trempe, formada por três pedras soltas, em que se
assenta a panela sobre o fogo; itacuruba; tacuruba.
Expressão extraída de:
“Tabuleiros de negras velhas, ao lado de fogões
improvisados com tacurus de pedra e ferro, se estendiam em frente ao circo” -
Quem conta um conto, de Cornélio Pires – Editora Monteiro Lobato, 1925 (p.
100).
Moreninha linda do meu bem querer:
Trecho da música Moreninha Linda, de Tonico e Tinoco,
muito tocada em ritmo de rasqueado nas festas em Cuiabá.
Inserções:
Trechos de toadas de Siriri de composição de Maria
Madalena Macedo, Diretora Artística do Grupo de Siriri Pixé, do Centro de
Cultura Matogrossense Flor de Pequi, de Nova Mutum, MT.
Enredo e Sinopse:
Roberto Oliveira
Consultas:
Claval, Paul – A Geografia Cultural- Ed. UFsc , 1999:
63.
Pires, Cornélio - Quem conta um conto – Editora Monteiro
Lobato, 1925 (p. 100).
SIQUEIRA, Elizabeth Madureira. História de Mato Grosso:
da ancestralidade aos dias atuais. Cuiabá: Entrelinhas, 2002.
Cuiabá - Wikipédia, a enciclopédia livre.
http://brasilimperdivel.tur.br/origem-termo-cuiaba/
http://www.diariodecuiaba.com.br/especial2.php?cod=5&mat=15221
Tenuta, José Augusto – Cuiabá de Tchapa e Cruz, Ed.
Entrelinhas – 2015.
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