quarta-feira, 22 de agosto de 2018

GRES ACADÊMICOS DA MARÉ (RIO DE JANEIRO/RJ)

Sinopse enredo 2019


Kikun SiSan – A Tragédia das Iyàbàs

1 – Justificativa

Em seu primeiro ano, a Acadêmicos da Maré leva para a avenida a trajetória de sua comunidade. Numa mistura de mito e história, exaltamos a Maré, desde a origem geológica do terreno onde está localizada, até a comunidade linda que se tornou. Em 2019, vamos mostrar a Maré de um jeito que nunca se viu.
A Maré, e suas 17 comunidades, desfilará em cores e tambores a sua própria história.
Nosso Mito de criação (O que é Mito?)
Na tradição ocidental, chamam-se mitos, as narrativas muitas vezes fantásticas, que servem para transmitir algum tipo de ensinamento ou explicar as origens de um povo.
Antes mesmo do costume, que os povos adquiriram, de registrar sua história em livros, eles recorriam às peças de teatro. O texto, então, memorizado e declamado era cultuado em apresentações teatrais e assim, seus ensinamentos iam passando de geração em geração. Essa tradição oral garantiu a sobrevivência de muitas culturas.E é assim, que mais do que realizar um Carnaval, para 2019 a Acadêmicos da Maré pretende exaltar sua comunidade e propor a perpetuação de sua história através da criação de seu mito de criação.

Carnaval 2019:

KIKUN SISAN – A tragédia das Iyàbàs

O Conflito
Yémojá e Nàná(n), ambas, se declaram mães do menino Omólu e em uma disputa guerreiam mar e mangue.

Couro:
O mar, bruto, molda a terra
O mangue, negro, pinta o chão
Aquela que cuida, força materna
A que dá a vida, abandona, então.

Yémojá
O menino é MEU filho. Ela o abandonou. Meu filho é um grande senhor, rei de toda a terra. É a cura… a vida. O menino é meu filho. Eu fiz dele o que ele se tornou.

Nàná(n)
O menino é MEU filho. Ela o roubou de mim. Meu filho é o fogo do interior da terra, as lavas vulcânicas, os gases tóxicos… as epidemias, as febres, as convulsões. O meu menino é o poder da morte… da decomposição. O menino é meu filho. Meu ventre lhe deu a vida.

Couro:
E as mães, duelam, agitam as águas
devastadores poderes arriscam a harmonia
Das dores, rancores, a rivalidade, as mágoas
Esbravejam as mulheres, e a disputa principia

Yémojá
Sou YéYé Omó Ejá. Rainha de todas as cabeças do mundo. Sou mãe cujos filhos são peixes. EU SOU MÃE. Sou a mãe de todos os filhos. Meus órgãos de mãe, minha vulva e meus seios chorosos, são sagrados. Sou aquela que orienta, que mostra os caminhos, que educa, e sei sobre tudo, sei ver o que tem dentro de cada um. Eu me sacrifiquei tanto… eu chorei tanto por meus filhos que minhas lágrimas se transformaram num rio que correu em direção ao oceano. Minhas lágrimas deram ao mar o seu sabor de lágrima. Sou mãe, não faço distinção dos meus filhos, sejam como forem, sejam ou não do meu ventre. Humildemente criei, com todo amor e carinho, aquele menino cheio de chagas, ABANDONADO à beira do mar, e fiz irromper um grande guerreiro. Eu criei Omólu, o filho e senhor, o rei da terra, o próprio Sol.

Nàná(n)
Sou Nàná(n). Quando Odùduwà separou as águas e a terra, bem no ponto de contato entre esses dois elementos, formou-se a lama dos pântanos e mengues. Sou a água parada, água da vida e da morte. Sou a mais antiga Iyàbà. Sou a memória ancestral. Sou o destino. Sou a lembrança angustiante da morte, um fardo que todos carregam. EU SOU MÃE. Sou respeitada, como mãe por todos os orixás. O menino carregava a morte dentro de si. Por isso o deixei. A sabedoria mostra que a morte é condição para o renascimento, para a fecundidade, para a vida. É este o mistério da existência. Sou a chuvas, a lama, a terra, a juíza que castiga os homens faltosos. Sou o princípio, o meio e o fim. Eu gerei a própria morte. Por isso, não temi a morte de Omólu, FILHO DO MEU VENTRE.

Couro:
E o mar revolto, em Maré, se ergue
O mangue, avança, e contra o mar se arremessa
Que o que fora paz, em ira se alargue
E a harmonia, que fora, vê-se avessa…
E perece, como uma mera promessa.

A intercessão
O tempo passa. E o embate segue seu curso. Os senhores Obàtálá, senhor da passagem do tempo e Orúnmìlá, senhor do tempo de vida, demonstram preocupação com os efeitos da disputa.

Couro:
Os irmãos do branco, senhores do tempo
Ao ver violência, em tal desarmonia
Intercedem, para encerrar a contenda
Vêm ao Aiyé , e às mães se anunciam

Nàná(n)
Awon Mawu, Que bom que aqui estão! Sem a justiça, nunca retomaremos a harmonia.

Yémojá
Oluwa Mi Que bom que aqui estão! Carecemos de justiça. A justiça é o que dá sentido à vida.

Couro:
Em silêncio, mas atentos ao que é dito
Os senhores do tempo, permitem a discussão
Elas se exaltam, exigem seu veredito
Querem justiça, demandam compreensão

Yémojá
Diga a ela que ele é meu filho. Ela perdeu o direito sobre ele quando o abandonou. Eu nunca abandonaria um filho. O menino agonizava na beira do mar. Cuidei de suas chagas e de suas doenças. Vi surgir a mais bela das criaturas. Estamos ligados. Omómi Omólu é tão meu quanto qualquer outro filho meu.

Nànán
Diga a ela que ele nasceu de mim. Que eu nunca o abandonei. Eu o deixei para a morte… condição da vida. Eu estou certa. Sou mãe por direito. A matéria do que Omómi Omólu é feito, vem da minha matéria. Estamos ligados, em vida e em morte. Somos dois lados de uma só coisa.

O desfecho
Orúnmìlá e Obàtálá se pronunciam. Mostram que não há razão para as duas sigam em conflito. Mostram também que uma coisa linda nasceu de todo o tempo em que duelaram.

Obàtálá
E depois de toda esta disputa, vocês ainda não entenderam?
Orúnmìlá
De que vale o tempo de vida, se for para desperdiçá-lo, em conflito?
Yémojá e Nànán se calam.
Obàtálá
Quem não é Omólu, que não o mais poderoso. Generoso. Hospitaleiro. Ele tem o melhor de suas duas mães. Afortunado seja!
Orúnmìlá
Omólu nunca vai ser de uma de vocês, apenas. Ele sempre sará belo e reflexivo como Yémojá e sempre será profundo e acolhedor como Nànán.
Obàtálá e Orúnmìlá
Aceitem isso e encerrem esta disputa de uma vez.

Couro:
Um desconforto invadiu o ambiente
Nànán e Yémojá, não puderam achar o que dizer
Sabendo que entenderiam seu discurso, resiliente
Os irmãos viram-se e vão, como havia de ser
Mesmo antes de sumir nas nuvens Orúnmìlá para e fala, ainda, com as mães. Elas estão, ainda, atônitas com o acontecido.

Orúnmìlá
Vocês se sentem como se tivessem perdido um filho? A maior tragédia da maternidade é perder um filho. Mas, não sejam tolas. Foram 12 tempos, e nestes 12 tempos de sofrimento, uma coisa linda nasceu. Honrem as belezas daquilo que vocês mesmas criaram. Não lamentem, Olhem em volta. Olhem esta terra. Esta terra carrega a energia da coisa mais bonita que você Yémojá e você Nànán, já fizeram. Esta terra carrega a energia do filho de 2 mães, e que sempre será filho de duas mães. Esta terra carrega o ase, dele, Omólu. O rei de toda a terra, Òbáoluayiè.

Assim surgiu a comunidade da Maré, da disputa de duas mães por seu amado filho.

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