“Gigante
Pela Própria Natureza: Jaçanã e o Índio Chamado Brasil”
S I N O P S E
Abriram-se as
margens do rio ao sol nascente, que esverdeava ainda mais a mata e
azulava o céu incandescente, para desvendar uma lenda indígena que
falaria a um pequeno índio-menino sobre uma relíquia.
E com o menino
começamos a caminhada…
Perto do rio, o
curumim levantou-se cedo – a pesca o esperava!
Animado na alma com
a vida na mata, bebeu escondido aluá e fartou-se com a pupunha da
sua mãe que sempre o alimentava.
Beijou-a e sozinho,
fingindo ser o homem que ainda não era, pulou em sua canoa sem
destino rumo à peripécia que, os grandes, espera.
Pelo rio, com riso
nos lábios e vontade de alegria na pescaria e na jornada, o curumim
gritava alto às águas para espantar Boiúna, ou tudo, ou nada:
“Eu sou Brasil!
Tenha medo de mim!
Aqui quem fala é um
pequeno gigante
que já pesca com
vontade danada de gente grande!”
A canoa em frente, a
flecha armada, curumim pescava e brincava baixinho para conseguir
pegar a jatuarana sem espantá-la.
Com o sol forte da
manhã, entretanto, Brasil resolveu descansar do seu gracejo.
O pequeno deitou-se
na canoa embalada pelo banzeiro e adormeceu para sonhar o sonho dado
ao miúdo bravo guerreiro…
A canoa, no mundo da
fantasia, transformou-se em Jaçanã e partiu…
Levantou voo do rio
e Brasil a tudo assistiu:
“Pequeno menino,
quero lhe contar sobre a sua irmã tão mais nova que é quase filha!
Será forte e
esperançosa, um ponto de luz no universo que nascerá em abril.
Sabe-se que ela terá
muito a dar aos homens e mulheres de boa vontade na terra, e que será
grande, gigante, reta, moderna, só podendo ser entendida se
soubermos sobre sua pátria-família, a verdadeira mãe e geradora da
sua irmã nessa cantiga”.
A Jaçanã, montada
pelo menino e com asas batendo forte, foi primeiro para baixo
cruzando serras no céu anil.
Mostrou ao pequeno
Brasil um pampa aberto sob as estrelas, enorme!
Lá, irmãos brancos
de cabeças amarelas montavam seres mágicos e galopavam amarrando
com laços outros bichos encantados.
Tomavam bebida
quente em cuias e, Brasil, espantado, ouviu deles o recado:
“Mas o pranto,
afinal, que essa cólera encerra tomba: é a chuva que cai e que, o
Paranoá, rega; e a cada gota, ali, cada gérmen se apega fecundando,
a minar modernamente, toda a terra”.
Jaçanã levantou-se
de novo voando para longe dando adeus aos cabeças-amarelas que
apontavam para outro fronte.
Brasil desconfiado
não entendia o sonho: seria um delírio?
“Não, pequeno
menino meu…” – disse Jaçanã. “É uma profecia!”.
Chegando em outro
pedaço daquele mundão, Brasil viu irmãos orando e rodando pedindo
clemência pela dança a Deuses que o índio desconhecia.
O povo preto clamava
igualdade e liberdade, e na dor sofria sem esquecer nunca a força
ancestral que para sempre na resistência lhe caberia.
O povo preto um
beijo deu na Jaçanã e ao Brasil declamou um pouco de crença
afinando a profecia:
“São duas asas
unidas de dois pajés construtores nascidas.
Talvez do mesmo
arrebol, vivendo toda a gente no mesmo chão arado e concretado, da
mesma gota de orvalho, do mesmo raio de sol”.
O menino ainda não
entendia… O que era essa tal profecia?
Jaçanã com pressa,
pois sonhos têm prazo certo, decolou e ali perto encontraram outro
pedaço de terra que misturava areia, água salgada e pedra.
A gente irmã suada
do litoral também apontava para outro local e embebida nas cantorias
e Novas Bossas suas sinas, misturando-as com palavras das Minas,
profetizou o futuro do seu passado para o menino:
“‘No princípio
era o ermo eram antigas solidões sem mágoa.
O altiplano, o
infinito descampado no princípio era o agreste: O céu azul, a terra
vermelho-pungente e o verde triste do cerrado.
Eram antigas
solidões banhadas de mansos rios inocentes por entre as matas
recortadas.
Não havia ninguém.
A solidão mais parecia um povo inexistente dizendo coisas sobre
nada’.
Mas…
‘Para cantar,
pelas Duas Asas, de amor tenros cuidados, Tomem entre vós, do
mineiro cacique, a vontade e o instrumento;
Ouvi pois, dos
Candangos, o fúnebre lamento; Se é que de compaixão sois
animados’”…
Jaçanã enfim
pronunciou:
“Está vendo,
menino Brasil, o que essa gente toda conta?
Querem amor e união
em uma nova casa pronta!
Modelada por dois
pajés, realizada pelo cacique e feita por nobres sofredores
Candangos, com a ajuda e a idealização de tantos outros de agora e
de outrora, será o projeto moderno centro desse chão!
Nova pindorama de
árvores retorcidas nascida porque filha dos filhos dessa terra em
confraternização!”.
Voou então a ave
para outro rincão para mostrar uma família que tanto padecia no sol
lascado braseiro de testas, Vidas Secas e Severina!
Pés marcados no
chão rachado e as mãos apertadas sem brecha, todos da família
oravam de joelhos pedindo esperança e bom agouro, alguns dos futuros
Candangos esses cabras-da-peste.
Quando viram Jaçanã
e o menino Brasil, logo correram e apontaram para o Oeste:
“Ave Musa
incandescente do deserto do Sertão!
Forje, no Sol do meu
Sangue, o Trono do meu clarão: Cante as Pedras encantadas e a
Catedral Soterrada, Castelo deste meu Chão!”.
E, rápida, para o
longínquo Centro-Oeste, onde outros Candangos de lá já aguardavam,
Jaçanã levou o pequeno Brasil.
Pousou no meio
daquele cerrado e ela mesma, antes de sumir, sorriu:
“Brasil, no futuro
essa profecia se revelará a um Padre-Santo em outro sonho para se
realizar em moderno Piloto Plano! O que os cabeças-amarelas, os
pretos, os filhos do mar, das Minas e os futuros Candangos recitavam
e apontavam será aqui: sua irmã, o lugar de fé que unirá aquela
gente, aquele povo todo, para o mundo jorrando leite e mel com gosto…
A terra mística no
alto desse Planalto que se levantará tentando nos dar ‘sessenta’
anos em cinco de avanço sem percalço com tanta gente junta que se
esparramarão para além das Asas da casa, deitando-se até em seu
entorno com as cores das suas culturas servindo de reboco!
Vem, menino Brasil,
anime-se! Sua irmã Brasília será ave que voa e rodopia!”.
Deitou-se então no
seu jazigo e, abrindo as duas asas, Jaçanã ao chão se fundiu, o
corpo inteiro tornando-se asfalto e magia.
Um pássaro que
viraria casa para o Brasil, quem diria?!… Daí a queda! A volta! Um
clarão!
Uma marola sacudiu a
canoa e acordou o bravo menino de supetão! Brasil navegou ligeiro de
volta não mais à toa deixando as jatuaranas animadas na água boa.
Pé na margem, foi
correndo contar para sua mãe o sonho da canoa!
“Mamãe, Mamãe!
Sonhei com uma profecia!”.
A mãe no chão,
sisuda de terra, ouvia…
Pediu calma ao
menino, pois também tinha uma linda notícia, e sorria:
“Filho meu, Brasil
pequenino…
Descobri hoje com o
xamã que você terá uma irmã!
Em sua homenagem se
chamará Brasília!
Uma menina-Brasília
que será gigante pela própria natureza!”.
Alma cheia d´água,
o menino pressentiu: Sabia que cedo ou tarde sua irmã seria grande
como aquele rio e no futuro a filha da profecia!
Pensou na Jaçanã e
feliz decidiu ir brincar: Quem sabe se o destino de todo mundo não é
sempre para uma casa voltar?
Mas, se tudo isso é
estória, fato mais bonito (re)inventado do sonho de um curumim
lendário talhado na memória, a realidade é outra coisa…
Contudo, pede-se
licença para imaginar contos de límpida felicidade no Carnaval para
nesses dias acalmar o sofrimento incessante do doloroso real.
Assim, Vila Isabel,
canta essa Brasília irmã com o pequeno Brasil e sua Jaçanã, a
doce morada nos dada de encomenda pelas bênçãos do céu azulado
orvalhando o cerrado!
Bênçãos da
Aparecida Nossa Senhora, Padroeira dos filhos do Brasil e da nossa
Brasília, desejosas de igualdade generosa!
Livrai-nos, Santa,
da dor e do mal, cravando nas retas da cidade as curvas do coração
desse povo bravo, heroico, sofrido, estopim da chama da cidade
candente de migração…
Ah, Brasília! Pois
honrando tua inspiração que caibam no teu seio muitos Brasis
forjados pela oração!
Recebe-nos, Irmã,
com lágrimas de misericórdia então e cuida, enfim, dos gemidos da
nação em oferenda, pois na Sapucaí, só por hoje, saibam todos, o
resto tudo é tudo lenda…
Autores:
Edson Pereira, Clark
Mangabeira, Victor Marques
Texto e pesquisa:
Clark Mangabeira e
Victor Marques
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