Sinopse enredo 2021
Resistência
Maior
cidade escravista das Américas, o Rio de Janeiro foi o palco da
assinatura da Lei Áurea, diploma legal que extinguiu o trabalho
cativo no Brasil. Abolir a escravidão, porém, não foi suficiente
para promover as mudanças tão desejadas por todos nós. Abandonados
pelo Império, continuamos sem condições para uma existência
decente. Libertos, tornamo-nos prisioneiros da miséria nos cortiços,
nas ruas, nos trabalhos precários e na ausência de direitos humanos
e sociais básicos. Discriminados e marginalizados, sem cidadania,
sem alternativas para uma vida digna, fomos lançados à nossa
própria sorte. Excluídos – no dia seguinte, na década seguinte,
no século seguinte –, vivemos, até hoje, sufocados.
Ser
preto no Brasil e no Rio de Janeiro, hoje, é ter que lutar
diariamente por respeito. Lutar para não ceder nem sucumbir à
segregação e ao constrangimento promovidos pela sociedade e pelo
Estado. É recusar os abusos e a submissão pela ausência de
políticas públicas que poderiam promover melhores condições de
vida. É não se deixar enganar pela pseudo “democracia racial”,
sempre camuflada por hipocrisia, eufemismos ou subterfúgios mal
disfarçados.
Aqui,
ser preto é, acima de tudo, um ato de RESISTÊNCIA.
E
resistir é ter nossa história, antes negada e silenciada,
ressignificada e recontada no carnaval, lugar de alegria, mas também
de diálogo com o mundo. Ao som dos tambores ancestrais, o Salgueiro
foi pioneiro na introdução da temática africana nas escolas de
samba. Seguiu na contramão da narrativa “oficial” do país e deu
vez e voz aos personagens, heróis e protagonistas pretos. Como um
Griot, transmitiu ricas histórias por meio de seus enredos e
desfiles, consolidando a participação da escola no processo de
resistência cultural e de luta contra o racismo institucional.
Resistir
é plantar um legado nos “chãos” do Rio de Janeiro. Criamos
Quilombos, lugares de resistência e insurgência, com estrutura
politica, econômica e social africana. Revivemos a história nas
marcas deixadas na Pequena África, região que se destaca como lugar
de acolhimento e também por personagens como as tias baianas
festeiras da Praça XI, cozinheiras e Mães de Santo celebradas até
hoje pela fantasia e pelo rodopio que as nossas Alas de Baianas
exibem. Foram elas que formaram o espaço sociocultural do samba,
entendido como extensão dos terreiros de Candomblé.
Resistir
é professar nossa fé. Por ela nos unimos nas irmandades religiosas
que faziam filantropia por justiça social. Construímos os terreiros
de Candomblé, templos que são uma reinvenção do macro universo
cultural e religioso trazido do continente africano. Desenvolvemos o
Culto Omolokô e criamos a Umbanda, religião afro-brasileira surgida
no Rio de Janeiro, que sincretiza elementos do Candomblé, do
Espiritismo e do Catolicismo.
Resistir
é expressar nossa cultura para manter a continuidade de valores
civilizatórios. Com a benção dos orixás, entramos na cozinha,
espaço de saber, para alimentar o corpo e a alma. Para transformar
alimentos, hábitos e a própria culinária brasileira. Ao som dos
atabaques, “compramos o jogo” nas rodas de capoeira e dançamos
jongo ou caxambu. Pisamos nos gramados para expulsar os cabelos
esticados e o pó-de-arroz que “disfarçavam” a cor da nossa
pele. Colorimos as passarelas e as ruas com as formas, signos,
símbolos, texturas e acessórios de nossa moda.
Resistir
é fazer arte. Inquietos por representatividade e pela visibilidade
que insistem em nos sonegar, criamos nossas próprias narrativas e
espaços nas artes cênicas, como o Teatro Experimental do Negro.
Assumimos nosso protagonismo e nos fizemos enxergar também por meio
da literatura, da dança, das artes plásticas. Espalhamos para o
mundo a vocação artística que reside em nós.
Resistir
é festejar. É revelar nossa maneira de ser por meio das festas, do
modo de celebrar a vida, do entusiasmo que propicia o resgate de
nossa identidade e afirmação existencial. Desde o chorinho na Festa
da Penha, passando pelas escolas de samba, afoxés e blocos afro.
Pelo pagode à sombra da tamarineira, pelo funk carioca e pelo
charmoso baile sob o viaduto de Madureira.
Resistir
é existir.
É
continuar a reverberar a coragem dos nossos heróis contemporâneos
de pele preta. / É saber que somos frutos de uma mesma raiz de
igualdade, fé, esperança, arte e vida. / É crer que nenhuma luta
foi em vão. Que nenhuma luta será em vão. / É persistir no sonho
de igualdade para que ele não seja silenciado. / É entender que,
juntos, em cada passo e em cada pequena mudança, seguiremos adiante.
/ E é ter certeza que no dia em que fizermos cair todas as máscaras
da discriminação, conseguiremos, enfim, respirar.
Autoria
e curadoria: Dra. Helena Theodoro
Carnavalesco:
Alex de Souza
Concepção:
Eduardo Pinto e
Marcelo
Pires (Diretoria Cultural)
Texto:
Paulo Barros
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