terça-feira, 25 de abril de 2023
ARC MOCIDADE UNIDA DA GLÓRIA (VILA VELHA/ES)
"Massena: Um Olhar em Aquarela"
JUSTIFICATIVA
O Sambão do Povo é tela em branco para a arte em sua plenitude. E a Mocidade Unida da Glória, honrosamente, brinda sua comunidade e os sambistas com uma justa homenagem a um artista apaixonado, necessário e infinito. Homero Massena, aqui tratado carinhosamente por Massena, é dono de uma obra que atravessa o tempo e inspira gerações. Considerado o pintor mais importante para a história do Espírito Santo, ainda que não fosse um capixaba de nascimento. Mas o mestre é, por tudo e para sempre, um verdadeiro capixaba de coração.
Nascido em Barbacena, Minas Gerais, em 1885, o artista tem a trajetória atravessada pelas artes já na infância. Mesmo período em que conhece aquela que seria o motivo do brilho de seus olhos e sua grande musa inspiradora: Vila Velha. De um bucolismo hoje já extinto, mas milimetricamente eternizado pelo pintor. Um amor à primeira vista entre artista e paisagem, revisitado a cada viagem ao Espírito Santo.
Pelas mãos da arte, Massena conheceu o mundo e se tornou reconhecido. Pintou um Brasil único, por onde transitou por décadas sem fixar moradia. E foi aqui, em 1951, que escolheu viver a liberdade de seus últimos anos. Funda a Escola de Belas Artes do Espírito Santo, mesma instituição da qual também foi professor. E compartilhou com artistas locais sua arte e seu amor por esta terra, tornando-se o primeiro pintor a utilizar técnicas impressionistas por aqui. Sempre munido de brasilidade, luz, calor e movimento: elementos fundamentais em seus trabalhos.
Suas pinceladas, limpas e carregadas de sentimento, ganharam forma em todo tipo de superfície: telas, tiras de tecido, madeiras, paredes e marcos de porta. Pintando paisagens, personagens, momentos e Vila Velha, o seu grande amor. Sempre com a mesma paixão, dia após dia, até às vésperas de se tornar eterno, aos 89 anos de idade, no ano de 1974.
Massena cumpriu uma nobre missão: retratar o simples e eternizá-lo, para o seu público e para si mesmo. E aqui não exaltamos somente o pintor que vendeu 75 telas inéditas em apenas 2 dias, ou o brasileiro com exposição permanente na Galeria Rembrandt de Paris. Mas, sim, o Homero em sua essência, inquieto e profundo, que empenhou toda a sua refinada técnica para pintar a simplicidade do dia-a-dia. E, principalmente, que dedicou seu olhar apurado para encontrar nobreza no popular.
Em 2024, ano em que se completam 50 anos de sua eternidade, (re)pintar Homero Massena, resgatando seus traços inconfundíveis e sua paixão é, sobretudo, um dever. Para que jamais sejam esquecidos aqueles que fizeram, fazem e farão da arte sua vida e seu universo particular. Seja onde, para quem e em que tempo for.
Sem limites. Sem medo. E sem fim.
SINOPSE
Corre o menino pelas ruas de pedra de Barbacena, todos os dias, com sabor de primeira vez. Apressado, ele se desvencilha dos materiais escolares, enquanto, de braços abertos, beija a liberdade de ser criança. É hora de ver as rosas. Muitas. De todas as cores. Afinal, quem pode preferir somas e cálculos, tendo ao redor uma natureza infinita? O caderno jogado no chão, com páginas cheias de flores pintadas em lápis de cor, aponta uma profecia: antes mesmo de saber o que é arte, ele já havia sido escolhido por ela. E seu destino é brincar com cores.
Filho de saltimbanco, Homero visita inúmeros lugares, registrando tudo em seus desenhos. Mas é ao conhecer o Espírito Santo, terra de seu pai, que sente pela primeira vez a sua alma infantil ser tocada pela arte. Ele vê diante de seus olhos o seu novo jardim preferido: Vila Velha. Chão de terra batida, águas do mar beijando as ruas, pássaros revoando livres sobre uma natureza exuberante, como se pintada em aquarela. As flores de Barbacena eram lindas, mas as rosas amarelas espalhadas por todos os cantos de Vila Velha dão um novo tom. Ele nunca mais deixaria de retornar para vê-las em seu novo paraíso particular, onde a vida parece acontecer sem pressa.
Nem tão sem pressa assim, o tempo corre no relógio em suas mãos. Torna-se aprendiz de relojoeiro, afinador de pianos e até saltimbanco como o pai. Funções de uma vida agora adulta que, mesmo diferentes, carregam um só objetivo: conseguir manter-se e manter a arte sempre por perto. Ela permanece. Os lápis de cor ganham a companhia de pincéis, e as folhas de papel dividem a atenção com todo tipo de superfície onde as pinceladas possam ser abrigadas. Assim, entre trocados garantidos com pinturas de retratos e decorações de fazendas, Homero chega a Paris. E chega como tela em branco, para receber na Cidade Luz a técnica e os matizes necessários para dar ainda mais vida ao que mais ama fazer: eternizar o belo.
Já cidadão do mundo, ele volta. O Brasil – brasileiro, mulato e inzoneiro – recebe de volta um Homero pronto. A bagagem cheia de aprendizado e a alma transbordando saudade eclodem um artista iluminado. Um antropofágico. Capaz de devorar a delicadeza do Impressionismo europeu – o sol, o instante, o recorte – e aplicar em um cenário tropical e quente, onde a natureza é completamente banhada pela luz. Aflora, aqui, uma brasilidade ímpar e tropicalista. Torna-se conhecido nacionalmente por Massena, e encontra um dom: leva o observador a viver suas telas. Ouvir o sussurrar das ondas, sentir o frescor da sombra das árvores, perder-se na leve dança das folhas de bananeira ao vento. E, de repente, perceber que compreendeu verdadeiramente uma obra de arte. Único.
Seu maior mérito, mesmo já reconhecido e vivendo de sua arte, é levar vida afora um valor inegociável: ver nobreza no simples. Capaz de transformar um pequeno atelier em um fértil nascedouro de criatividade e de um Brasil vivo. Casas brasileiras, cercas de bambu, mães segurando os filhos pela mão, lavadeiras ensaboando lençóis em bacias de alumínio, enquanto nuvens se dissolvem em um céu otimista. Deitar o impressionismo sobre um Brasil real e incandescente, com sol a pino, é uma missão. É dizer, com tintas, que nada pode ser mais festejado que a chegada da pesca, por exemplo, uma cena tantas vezes retratada em sua obra. Os guris correndo no pasto, também frequentes nas telas, registram a própria liberdade infantil já vivida por Homero. Ele interrompe os pinceis e reflete. É seu destino.
A vida é cíclica. A profecia de infância - ser escolhido pela arte e brincar com cores - se cumpre, em forma de um irrecusável convite: plantar em novos artistas o amor pela pintura. Uma ajudinha do destino para facilitar o regresso de Massena ao maior jardim de sua vida: Vila Velha. A casa 281 da Prainha, exatamente onde o Espírito Santo começou, passa a ser o endereço fixo de seus pincéis mágicos. De volta, desta vez para sempre, ele passa a testemunhar tudo o que pode, com aquele mesmo coração acelerado de menino. E à medida que os cabelos tornam-se brancos, a paleta ganha ainda mais cores. Um silencioso duelo particular, onde a criatividade sempre vence, como se gritasse: encontrei e estou vivendo a plenitude dos meus dias.
Massena pinta como se tivesse pressa em recuperar o tempo perdido. Os diferentes tons do mar, a subida dos capixabas ao Convento da Penha, a própria casa que escolheu para viver com sua amada Edy, os postais natalinos para amigos próximos e ilustrações em páginas livres dentro de seu livro de cabeceira, Os Sertões, de Euclides da Cunha. E até sob as luzes da ribalta, já aos 84 anos e como quem toca um céu de rosas, se faz criança outra vez eternizando jardins. Um inquieto em constante movimento, que vê em cada pedaço de vazio uma oportunidade de preencher com o todo. O mestre conclui sua missão da forma mais magnífica possível. Não bastasse levar ao mundo a sua arte, leva o mundo para dentro de casa como memória viva. As rachaduras transformam-se em galhos, floridos um a um com rosas amarelas, que enfeitam a residência e ajudam pássaros, também pintados, a
repousarem. Livres, em paz e banhados de luz.
Há cinquenta fevereiros, Massena é eterno. Sua arte, atemporal, também. Mas ainda é possível encontrar por aí vestígios e cenas retratadas em sua obra. Os guris, a pesca, as flores, o mar. A casa da Prainha, hoje Museu Atelier Homero Massena, é testemunha de uma história tão necessária quanto a obra do mestre. Uma história que merece ser contada de arte para arte.
Com cor, luz e movimento. Com Carnaval.
Carnavalesco: Petterson Alves
Enredista: Leo Soares
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