No
Pregão da Folia Sou Comerciante da Alegria e Com a Estácio Boto Banca na
Avenida
Como é arrebatador esse sol que brilha nessa terra
maravilhosa dos encantos mil. E que bom rever minha São Sebastião do Rio de
Janeiro tão próspera em atividade mercantil. Voltei de tempos passados à cidade
que fundei para entrar na história que minha agremiação querida quer contar.
Faço-me presente, com satisfação, para aplaudir minha escola a desfilar.
Sou o valoroso lusitano Estácio de Sá, vim de longe, de
terras D’além mar. Meu grande feito foi daqui expulsar os franceses com o apoio
dos índios aliados para essa linda cidade fundar. Parece absurdo, como podem
portugueses unidos a indígenas guerrear? Ora, é simples explicar: para a
confiança e a adesão dos nativos conquistar, foi preciso bugigangas da
civilização lhes presentear.
Esse troca-troca do toma lá dá cá, do me dê me dá, muito
encantou esses curiosos guerreiros, com muitos objetos, muito espelho. E foi
assim que se aliaram à minha batalha, seguindo meu audacioso conselho. Por esse
meio, aconteceu o primeiro escambo, desde que aqui nessas terras tropicais
chegamos. Os índios levaram para suas aldeias o produto do primeiro comércio
com os brancos e juntos comungamos. E com essa transação inicial, a fundação
desse torrão carioca comemoramos.
Esse solo recém-achado teve suas riquezas extraídas para
se comerciar em lugares distantes. Muito foi derrubado o pau-brasil por ser
naquela época aqui abundante. Grandes carregamentos de especiarias ao velho
mundo abasteciam. Saquearam tanto nosso solo sem nem considerar os que no
futuro viriam.
Traficaram tudo, arrancando de seu berço africano até o
negro rei, escravizado para o trabalho forçado nas lavouras da cana de açúcar e
de café, para aos de pele alva servir. Máquinas humanas subjulgadas, adquiridas
para a produção do refinado e da bebida quente, que uma desumana sociedade se
abastava em consumir. Nesse período triste do cativeiro, escravos de ganho não
libertos ganhavam dinheiro vendendo pelas ruas em bandejas diversos produtos.
Usavam seu lucro para a compra da alforria em busca de um viver quase absoluto.
O comércio das ruas e praças do período colonial e
imperial muito foi registrado em cores vivas pelo francês Debret. Pinturas que
mostram o cotidiano dos vendedores ambulantes, retratos feitos com pinceladas
de talento, admiráveis de se ver. De tudo vendiam esses primeiros camelôs:
frutas, doces, salgados, sucos, aves, flores e tantos outros bibelôs.
De porta em porta, chegavam os mascates oferecendo suas
quinquilharias. Para o caixeiro-viajante, seus artigos de venda para todos
tinham alguma serventia. Com suas bugigangas e novidades da Corte, abasteciam
os sonhos da população, dos fregueses conquistando a simpatia.
Explorando nosso chão território adentro, foram
retiradas das minas toneladas de minerais. Seu escoamento para longe era
comandado por oficiais das Gerais e de Goiás. O ouro e o diamante viraram para
os lusos fonte de renda. Aqui garimpeiros, receptadores e negros livres
negociavam metais valiosos e pedras preciosas por encomenda. Nessa cobiça de
enricar e mudar de vida, alguns por vezes até sem escrúpulos se trucidando.
Porém tudo que é desbastado em demasia um dia se finda, aos poucos a opulência
da rica seiva do solo foi secando e dela ficou desprovida.
Os interesses comerciais mudam de acordo com a demanda
do mercado. Sucedem-se ciclos econômicos para manter a lucratividade e o
consumo da sociedade com certificado. No grande mercado brasileiro, tudo vira
moeda de troca rentável. O tabaco, nesse contexto, já teve outrora no sertão
seu valor, enviado para os europeus era especiaria bastante apreciável.
Na Praça Quinze, teve seus tempos áureos o Mercado
Municipal, o maior entreposto de gêneros alimentícios da cidade no século
passado. Desfigurado por um projeto de urbanização, do patrimônio histórico
sobrou apenas uma torre da construção. Hoje em vez de comprar alimentos de todo
sortimento, um restaurante especializado em frutos do mar se transformou para
nosso degustamento.
A mão de obra que impulsionou nossa economia já foi do
trabalho escravo do indígena e do negro e depois do trabalhador assalariado.
Muito contribuíram os imigrantes com o desenvolvimento dessa nação, vieram de
toda parte do mundo para integrar nosso primeiro proletariado. Além da presença
remota da colônia portuguesa aqui, vieram outros estrangeiros aos milhares para
no Brasil viver. Famílias inteiras ocuparam diversas regiões do país e
trabalharam em vários setores para sobreviver. Esses trabalhadores de terras
distantes arregaçaram as mangas e contribuíram bastante na construção da nossa
pátria amada, verdadeiros comerciantes forasteiros veteranos, de competência
considerada.
Quem nunca entrou nas quitandas e padarias do Seu
Manoel? Nas pizzarias e cantinas das mamas de tirar o chapéu? Nos antigos
turcos armarinhos? Nas lojas libanesas de tecidos no caminho? E quem nunca
comeu um pastel com caldo de cana nas pastelarias chinesas por todos os bairros
espalhadas? E ainda não provou os quitutes típicos dos refugiados sírios e
angolanos em saborosas abocanhadas?
Nessa engrenagem, o comércio popular mantém a circulação
do capital sempre a girar. É preciso pesquisar preço nos concorrentes para o
minguado dinheiro ganho esticar. Nas feiras livres semanais, é de costume as
madames barganharem o desconto dos hortigranjeiros fresquinhos. Nos essenciais
supermercados, seções abastecem as necessidades da vida urbana com atraentes
promoções que causam burburinho.
E o que dizer do garimpo de relíquias feito nos sebos,
nos brechós e nos mercados de pulga que o boca a boca divulga? Na Lavradio, uma
vez por mês são espalhadas barracas no asfalto que vira point cultural em busca
do freguês. Vantajosos passeios na CADEG e na Feira de Tradições Nordestinas,
com balanças pesando convidativas ofertas a quilo que favorecem nosso bolso já
fazem parte da rotina. E o impressionante mundo de coisas acessíveis reunido no
Mercadão de Madureira e no Saara, atendendo a todos os gostos de forma
certeira! Mas para quem não quer sair de casa, a praticidade de comprar pelo
computador, sinal dos tempos modernos que agrada ao consumidor.
Dessa forma fascinante, as mãos produtivas do
comerciante na lida diária vamos exaltar. Reconhecendo a importância desse
segmento na sociedade, com nossa medalha de ouro a eles vamos laurear.
Com a Estácio boto banca na Avenida, no pregão da folia
para vender minha mercadoria. Tenho ouvido de mercador para atender a
clientela, levando tudo por uma bagatela! Hoje tem fiado para quem pagar
adiantado, pois quem manda é a freguesia!
No pague e pegue do carnaval, alegria e gente bamba com
orgulho vamos exportar. Sem bravata e com felicidade no rosto, quero ver o
gingado da mulata a comemorar! Estaciano eu sou de fato e rumo ao estrelato, o
caneco quero levantar!
Carnavalesco: Tarcisio Zanon
Autor da sinopse: Julio Cesar Farias
Referências bibliográficas
– CASTRO & GIAMBIAGI & HERMANN, Lavínia, Fábio e
Jennifer. Economia Brasileira Contemporânea. Rio de Janeiro: Editora Elsevier
Brasil, 2011.
– ENDERS, Armelle. A História do Rio de Janeiro. Rio de
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– LEITÃO, Mércia Maria. Um Fotógrafo Diferente Chamado
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– LIMA, Gabriel. Comércio Eletrônico – Melhores práticas
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– OLIVEIRA, Lucia Lippi. O Brasil dos Imigrantes.
Coleção Descobrindo o Brasil. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2000.
– PIRES, Marcos. Economia Brasileira – Da Colônia ao
Governo Lula. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 2014.
– SATO, Leny. Feira Livre – Organização, trabalho e
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– SENNA, Ernesto. O Velho Comércio do Rio de Janeiro.
Rio de Janeiro: Editora G. Ermakoff, 2006.
– VALBUZA, José Cláudio. Técnicas de Comercialização.
Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 2012.
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