Rainhas
do Rádio - Nas Ondas da Emoção, o Tigre Coroa as Divas da Canção
Tudo começou em meados da década de 1930, início da era
de “ouro do rádio”, que atingiu seu auge nos anos 40 e 50: um período marcado
por requinte e glamour, especialmente no Rio do Janeiro, então capital federal,
chamada de Guanabara. Os belos cassinos, teatros, hotéis, bares e boates
respiravam prosperidade, dando a cidade uma aura mágica, quase um mundo de faz
de conta. E para coroar esse universo mítico, foi fundada a Rádio Nacional
tornando tudo ainda mais especial, pois a emissora tinha a missão de integrar o
país, ditando modas e costumes. Sua programação variada fascinava, e através do
sucesso dos seus programas musicais, cada vez mais populares, os grandes ídolos
foram criados. E assim, a Cidade Maravilhosa se tornou o coração desse novo
reinado, onde a realeza da canção arrebatou o país inteiro.
Bastava ligar o rádio, num gesto simples de girar o
botão e as vozes invadiam os lares brasileiros de norte ao sul do país. Ninguém
ficava indiferente, todos queriam acompanhar a programação, extasiados pelos
sons que saiam daquele aparelho que se tornou indispensável. Os programas
musicais despertavam o maior fascínio e todos aprendiam as canções que caiam
rapidamente no gosto popular. Nessa disputa entre cantores e cantoras, coube as
vozes femininas, de forma única e particular, seduzirem os ouvintes… algo
difícil de traduzir, mas fácil de sentir. Um fenômeno que pouco a pouco, foi
tomando conta do coração de todos, num misto de paixão e adoração.
E nesse mundo de faz de conta, não existiu pseudônimo
melhor e mais adequado para definir estas mulheres do que este: Rainhas.
Majestosas ao interpretar canções vivas, canções de carnaval, de dor de
cotovelo e faziam tudo muito bem. Mistérios que só a alma do povo saberá dizer.
Soberanas, tiveram dias de intenso brilho, milhares de fãs – ou seriam súditos?
– as reverenciavam em todo país. Estrelas autênticas de nossa música popular,
que fizeram o brilho de uma época e que até hoje nos fazem sonhar.
Para atender o desejo popular em participar da vida de
seus ídolos, foram criadas publicações especializadas em rádio, com destaque
para a famosa “Revista do Rádio”. As gravadoras ganharam um grande impulso e
disputavam a peso de ouro nossas cantoras. As salas de cinema superlotadas, a
cada nova Chanchada da Atlântida, para ver seus ídolos cantando os novos
lançamentos musicais. Mas o que fez o Brasil realmente parar foi a competição
criada para eleger a Rainha do Rádio.
O primeiro concurso foi promovido em 1936 pelo jornal o
Diário da Noite em parceria com o bloco carnavalesco Cordão dos Laranjas. Os
primeiros concursos não tiveram grande repercussão a nível nacional, pois a
eleição era feita apenas pelo voto dos artistas e profissionais do meio radiofônico.
Nesse modelo, só deu a cantora Linda Batista, eleita sucessivamente por uma
década. Entretanto, quando em 1948, a Associação Brasileira do Rádio (ABR)
começou a organizá-lo, passando a eleição para o voto popular, o concurso
explodiu no Brasil inteiro e foram eleitas nove rainhas nesse novo formato.
Após a eleição, elas se tornavam verdadeiras garotas propagandas, ajudando a
promover tudo. Os concursos aconteciam na poderosa Rádio Nacional, que na época
simbolizava o “Palácio Real” de onde nossas soberanas reinaram…
Quem haverá de esquecer essas Rainhas? Começando pelas
irmãs Batistas, Linda e Dircinha, eternas estrelas. Carregando a famosa “Lata
D’água” na cabeça lá se foi Marlene, essa mulher cheia de vida, ocupar seu
lugar. O “Que será” de nossas vidas sem o seu amor, Dalva de Oliveira?
Quebrando toda “Rotina” surgiu Mary Gonçalves para reinar nessa história. É,
dizem que “tem francesinha no salão”! Será? Quem reinou mesmo nos salões e nos
palcos foi ela, a minha, a sua, a nossa Emilinha Borba. De vermelho e negro
vestindo a noite o mistério trouxe nossa Sapoti, Ângela Maria. Olhando pela
“janela do mundo” nos apaixonamos por “este seu olhar” Vera Lucia. Mas o que
gostamos é de você, Dóris Monteiro, que de conversa em conversa provou a todos
sua nobreza. Dizem que amor é bom de dar, muitos fingiram gostar, mas só mesmo
você Julie Joy, soube fechar com chave de ouro este ciclo real.
A eleição despertava a atenção do Brasil inteiro. Nossas
soberanas possuíam uma legião de súditos e súditas apaixonados que disputavam
voto a voto quem elegeria a sua Diva ao trono da realeza do Rádio. Os fã-clubes
tiveram lugar de destaque nesse sucesso nacional, pois era um misto de adoração
e devoção por nossas estrelas. Os fãs que frequentavam os Programas de
Auditório receberam o nome singular de “macacas de auditório”, devido ao
comportamento histérico ao ver seu ídolo de perto. No dia da apuração o país
parava para acompanhar nas ondas da Rádio Nacional o resultado. Após a contagem
de votos e o anúncio oficial da vencedora, as discussões e brigas tomavam conta
do público, pois a unanimidade era rara.
O “grand finale” deste acontecimento, ficava por conta
da coroação no Baile do Rádio. O baile mais popular e disputado do carnaval
carioca, pois nele, fora a folia carnavalesca que reinava, o público poderia
estar perto de seus cantores preferidos, além é claro, de ver a coroação da
Rainha do Rádio com toda sua corte. Aqueles que não tinham esse privilégio, a
grande maioria, se aglomerava do lado de fora para assistir ao cortejo da
soberana em carro aberto pelas ruas, para depois ser transportada da parte
externa do teatro até o palco, em um trono carregado por atléticos admiradores,
para delírio da multidão.
Dez privilegiadas mulheres puderam viver este momento de
encantamento… num período dourado do Rio de Janeiro e do Rádio no Brasil. A
elas, no carnaval de 2018, sintonizada na mais pura emoção, embalado em sonoras
ondas, Porto da Pedra com toda nobreza da Corte da Folia rende esta homenagem,
coroando novamente cada uma.
E assim nossas estrelas da música continuarão a brilhar…
Rainhas do Rádio – Nas ondas da emoção, o Tigre coroa as
Divas da canção!
Jaime Cezário
Carnavalesco/Autor do Enredo
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