Sinopse
do enredo: Cacá Diegues – Retratos de um Brasil em cena
Carnavalesco: Marcio Puluker
Pesquisa e texto: Julio Cesar Farias
Carnavalesco: Marcio Puluker
Pesquisa e texto: Julio Cesar Farias
Hoje vamos
percorrer os trilhos da alegria para nos ver no cinema. Todos estão convidados
a embarcar no nosso trem especial que vai partir de Belford Roxo rumo ao
Sambódromo, conduzindo animados passageiros para assistirem a um filme
emocionante na telona da Marquês de Sapucaí. Estrelas admiráveis também viajam
em cada vagão para ajudar a contar a vitoriosa trajetória do mestre
Cacá Diegues, o cineasta do Brasil.
Desembarcamos
na estação da folia para nosso projetor da ilusão começar a rodar a película
momesca mostrando fatos marcantes da vida e da obra de nosso ilustre
homenageado…
1º SETOR – VIDA DE CINEMA
O vibrante
colorido das diversas manifestações folclóricas do nordeste brasileiro sempre
esteve impregnado na memória afetiva e na vida de Cacá Diegues, mesmo morando
desde criança no Rio de Janeiro. Radicado no Rio por circunstâncias
familiares, foi adotado pela Cidade Maravilhosa e tornou-se um autêntico alagoano
carioca, pois não deixava de retornar a Maceió nas férias. Sua terra natal,
aliás, serviu como locação para alguns de seus filmes mais importantes.
Portelense de
coração e amante do futebol, morava em Botafogo, bairro de seu amado time, o
qual acompanha nos campeonatos desde garoto e pelo qual nutre grande paixão
como torcedor inveterado.
Foi nesse
tempo muito distante, por volta dos 6 anos de idade, que o pequeno Carlos José
Fontes Diegues entra pela primeira vez num cinema, levado por uma tia, em
Alagoas. Na sala escura, o menino fica espantado e encantado diante
daquela luz mágica que contava tantas histórias de gente bonita, parecidas com
aquelas deliciosas narrativas que sempre ouvia com atenção no colo do avô e da
sua babá. Histórias que, mais tarde, inspiraram muito de sua obra. Ao entrar na
sala e ser advertido pela tia para não botar a mão na tela porque ele ia ficar
preso nela, teve a certeza, nesse dia, que tinha ficado grudado nela para
sempre.
Imediatamente
apaixonou-se pela Sétima Arte e virou cinéfilo!
O cinema, na
sua juventude, dava asas à sua imaginação, aguçava a fantasia, ajudava a
escapar do rigor a que tinha que se submeter na escola jesuítica e ainda da
repressão materna em casa. Por isso fazia seus primeiros filmes de curtíssima
duração na câmera movida à corda do seu amigo vizinho David Neves, que também
seria cineasta, e não cansava de ir com ele às sessões semanais da Cinemateca
do Museu de Arte Moderna.
Embora
convicto de sua vocação, no final da adolescência, pela ausência de curso de
Cinema no país, Cacá Diegues optou pela faculdade de Direito. Nesse período
acadêmico, começa sua carreira como cineasta amador ao fundar um cineclube
e participar ativamente do Jornal da UNE “O Metropolitano”, embriões do
movimento cultural Cinema Novo, influenciado pelo Modernismo, que colocou a
imagem do povo brasileiro na telona.
Sua extensa
obra se inicia com curtas-metragens, destacando-se o pioneiro “Domingo”.
Diegues parte logo para a produção de filmes profissionais, estreando no
longa-metragem “Cinco Vezes Favela”, com o episódio “Escola de Samba
Alegria de Viver”, que mostrava as dificuldades e os dramas de uma comunidade
de uma pequena escola no morro do Cabuçu.
Eleito
presidente do Centro Acadêmico da PUC, realiza o primeiro evento musical
público de Bossa Nova, juntando eminentes artistas. Ainda no movimento
estudantil, Cacá foi um dos líderes do Cinema Novo, ao lado de grandes nomes como
Glauber Rocha, entre outros. Esse grupo começou a fazer cinema numa época em
que não havia televisão no Brasil e o país ainda não tinha uma imagem dele
mesmo. A ideologia desses jovens militantes tinha as pretensões utópicas
de mudar a história do cinema, mudar a história do Brasil e mudar o mundo.
Contudo, de
uma hora para outra, cai em suas cabeças fervilhantes de ideias uma terrível
ditadura militar para frear e triturar seus sonhos, exilando muitos deles em
terras estrangeiras e enterrando de vez o Cinema Novo. Cacá Diegues teve
proibido seu filme “Os herdeiros” (1969) e termina se abrigando na Itália e na
França. Nesse conturbado e sombrio período não deixou de fazer filmes,
resistindo à sufocante e inibidora “patrulha ideológica” da censura, também trabalhando
como engajado jornalista polêmico, escrevendo sobre Cinema.
2º SETOR – MULHERES FASCINANTES EM
CENA
Poucos
cineastas como Diegues retrataram com tanta propriedade a alma feminina. Sua
filmografia, sempre preocupada com a realidade e a desigualdade, deu voz a
mulheres protagonistas determinadas em papéis sociais em diferentes
épocas.
“A Grande
Cidade” conta a trágica história da iludida nordestina Luzia recém-chegada na
metrópole carioca. “Joanna Francesa” mostra as memórias da dona de um prostíbulo
paulista que vai viver numa fazenda com um cliente latifundiário alagoano
e sua conflitante família. “Bye Bye Brasil” revela a vivência de duas mulheres
muito diferentes: a decidida dançarina Salomé e a inexperiente Dasdô. “Xica da
Silva” apresenta uma mulher ousada que assusta a intransigente sociedade
colonial, a despeito de sua condição de escrava. Em “Dias Melhores Virão”, a
sonhadora e angustiada Marialva é uma dubladora que vive entre a realidade e a
fantasia e almeja se tornar uma estrela hollyoodiana. “Tieta” apresenta uma
mulher do agreste voluntariosa e fogosa que foi expulsa de casa pelo pai e
volta mais tarde endinheirada para se vingar de todos.
Mulheres
sedutoras muito diferentes entre si, que lutam pelo seu destino, com suas
histórias conturbadas por dramas familiares e amorosos vividos intensamente,
tendo como pano de fundo a sociedade brasileira.
3º SETOR – O ORGULHO DA NEGRITUDE EM
CARTAZ
A obra de
Cacá Diegues tem uma visão socialista do mundo, a favor da liberdade e da
igualdade. A causa do negro ainda era muito rudimentar quando ele começou a
fazer cinema, sendo então um dos precursores a falar de etnia, de uma
identidade afrodescendente na formação do nosso povo.
Sem perder o
tom político e a ternura, sua produção cinematográfica tem abraçado as raízes
formadoras da nossa nacionalidade. E mostrar a situação do negro escravo e do
negro liberto na favela, o Quilombo urbano moderno que são as comunidades
dos morros, foi o caminho percorrido, contribuindo com a questão da identidade
do negro no Brasil, o qual sempre foi posto à margem da sociedade devido ao
preconceito da classe branca dominante. Ser negro, em seus filmes, deixou de
ser uma situação vergonhosa, pois ele transforma seus personagens singulares em
importantes heróis da nossa história.
Ganga Zumba,
Zumbi dos Palmares, Xica da Silva, Calunga, Orfeu e os moradores das favelas
representam muito bem a essência da negritude brasileira.
4º SETOR – O BRASIL REFLETIDO NA
TELONA
Cacá Diegues
retratou a realidade do Brasil em cenas de cores carregadas de lirismo e muita
objetividade, captando o espírito de um povo e as mazelas de quem o governa. O
Brasil e o brasileiro são sua matéria-prima. Mostrou o país em constante
mudança, dando uma cara a essa imensa nação. Sua arte tem a capacidade de
exprimir em imagens o sentimento de uma geração, de uma época
histórica, abordando aspectos sociais e políticos.
Até quando a
conjuntura econômica foi massacrante, Diegues continuou no seu caminho,
gravando os fatos em cenas que nos fazem pensar sobre o mundo, sobre nosso país
e sobre nós mesmos. Ao viver e registrar o seu tempo presente, Cacá nos
deixa um rico legado de memória do Brasil para o futuro.
Muitas
questões são tratadas na sua filmografia, contudo todas pertinentes ao que sua
obra se propõe. Nela estão presentes um país em transformação, episódios
políticos, a luta por ideais, o rural e o urbano, o imigrante nordestino, a
cultura popular, o Carnaval, a malandragem, a violência cotidiana, os dramas
familiares e existenciais, o amor e a morte. Tudo recheado de muita reflexão e
embalado por uma trilha sonora cativante, nos chamando a ouvir cada canção com
o coração acalentado. Seu filme mais recente “O grande circo místico” é
uma síntese de toda a sua carreira, tanto no estilo, quanto no conteúdo.
Com esse
enredo felomenal, “Quando o carnaval chegar”, como a caravana de “Bye bye
Brasil”, vamos percorrer a Avenida com muita determinação e “O maior amor do
mundo”, invocando o espírito iluminado de “Orfeu” para conosco apresentar
mais um grande espetáculo com as bênçãos de um “Rio de fé”, afinal já está
sacramentado no coração de todo mundo que “Deus é brasileiro” e a Inocentes é
de Belford Roxo!
Nosso roteiro
está terminado, nossa produção acaba de gravar o melhor filme de todos os
tempos no set da folia, regido pelo olhar singular e pela direção precisa do
nosso glorioso cineasta. Finalizado o filme da fantasia, sob o brilho colorido
dos refletores, agora é rodar nossa fita carnavalesca para o deleite da plateia
do Sambódromo. Inspirados nesse gênio do cinema nacional, vamos fazer o maior
teatro de rua em forma de desfile para orgulhosamente entregar ao premiado
cineasta Cacá Diegues o merecido Oscar do samba.
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