Sinopse Enredo 2016
“MAIS DE MIL PALHAÇOS NO SALÃO”
Tanto riso, oh, quanta alegria
Mais de mil palhaços no salão…
Não me leve a mal,
Hoje é carnaval!
Zé Keti
Na época
medieval, os Mistérios e as Paixões (representações religiosas realizadas no
interior da igrejas) podem ser vistos como a materialização da relação do homem
com o riso. Se por um lado havia o sagrado inabalável, por outro tinha-se a
leveza da vida comum – e as formas de expressão dessa alegria localizavam-se no
polo oposto ao sagrado. A alegria representava, assim, na vida do povo, o
terreno e o material, o grotesco, que era uma das formas de expressão dessa
alegria, associada ao vulgar e à vida secular.
Uma figura
que encarnava por excelência os motivos do grotesco popular medieval era o
Diabo, por ser diametralmente oposto à Divindade. No carnaval, o diabo é
festivo – representando a glutonaria e a licenciosidade – o que fica expresso
em sua representação – metade homem, metade animal – e em sua presença
constante como figura burlesca. Foram tantas as diabruras, que faziam a plateia
rir muito, que as representações medievais foram transferidas para o exterior
das igrejas, tal a irreverência provocada por este senhor diabo.
Ainda durante
a Idade Média, onde houvesse um poderoso, conde, barão, príncipe… haveria pelo
menos um bobo da corte para divertir o senhor e seus convidados. Na cabeça, o
bobo usava um chapéu com pontas e guizos, a roupa era colorida – geralmente
verde e amarela. O verde representava a cor dos chapéus dos devedores e dos
condenados a trabalhos forçados; o amarelo, a cor da traição e dos lacaios.
Quando
os Milagres e Mistérios saíram do interior das igrejas, os artistas que circulavam
solitários pelas cortes e castelos passaram a se encontrar nas feiras em torno
dos feudos, e foram criadas verdadeiras companhias de saltimbancos.
Apresentavam espetáculos em que misturavam representação teatral, acrobacias,
dança na corda e etc.
As feiras
viram ponto de encontro de artistas de todas as artes e habilidades –
dançarinos de corda, volantins, malabaristas, jograis, trovadores, adestradores
de animais, pelotiqueiros, músicos, domadores de ursos, dançarinos,
prestidigitadores, bonequeiros e acrobatas.
Os
espetáculos dos Mistérios e Moralidades incorporaram mais um personagem cômico:
o rústico. Até mais ou menos 1500, a comicidade desse tipo de
espetáculo estava a cargo do Diabo e do Vice. O Vice era um camponês velhaco,
canalha, fanfarrão, covarde e representava todas as fraquezas humanas. Por
algum motivo, ele acabava se deparando com o Diabo, sempre acompanhado por um
séquito de pequenos demônios e metido em situações cômicas, que o transformavam
em figura ridícula. Aparece então a palavra clown, para designar o
rústico. E ele passou a ser um tipo com características bem definidas.
Continuava um grosseirão, meio caipira, mas ganhou esperteza, sua linguagem
evoluiu, adorava palavras difíceis.
Em 1768, o
sargento inglês Philip Astley construiu um anfiteatro ao ar livre, onde pela
manhã dava aulas de equitação e apresentava espetáculos equestres. Foi ele quem
teve a ideia que iria revolucionar o mundo dos espetáculos – num picadeiro
de 13m de diâmetro, mesclou exercícios equestres com proezas dos artistas
de feira.
O espetáculo,
baseado na disciplina militar e na valorização da destreza e do perigo, deixava
a plateia muito tensa, era preciso que o espectador tivesse momentos de
relaxamento. É aí que surge o palhaço do circo. O clown,
o campônio de quem os artistas itinerantes sempre gostaram de caçoar, veio a
ser o protótipo do bufão do circo.
Esse novo
tipo de espetáculo logo se espalhou pela Europa e pelas Américas. Os
primeiros palhaços: os pioneiros do circo moderno foram a princípio o palhaço a
cavalo e o palhaço de cena.
A cara branca
tradicional, feita com farinha, ou a preta, com carvão, surgiu primeiro
na França, com o trio cômico que fazia cenas em que representavam padeiros, que
terminavam sempre com a cara enfarinhada, jogando farinha uns nos outros.
Na França, o clown equestre era chamado de paillasse–inspirado
no Pagliaccio da Comedia dell’arte.
Os palhaços
se dividem em dois tipos – o branco e o augusto. O branco é mais elegante, de
roupas bordadas; o augusto representa quase sempre um vagabundo, com roupas
enormes, inclusive os sapatos, nariz vermelho e boca acentuadamente grande.
O palhaço
brasileiro foi criado nas festas do Brasil colônia. Eis a descrição de uma
dessas festas – “No domingo – palhaçadas! Saíram duas companhias de gente
mascarada e vestidas ao gracioso burlesco”. Todos se divertiam como palhaços,
brincando pelas ruas da cidade.
Não podemos
esquecer os ciganos que, na Vila Rica de Ouro Preto, realizavam comédias,
bailes, máscaras e etc..
No Rio de
Janeiro do século XIX, existiam casas de espetáculos com atividades dedicadas
quase que exclusivamente aos shows circenses.
As festas
populares também tinham seus palhaços – como a folia de reis, pastoris,
bois-bumbás e, sobretudo, a do Festa do Divino.
E assim,
pouco a pouco, começava a ser desenhado o jeito brasileiro de brincar.
Os palhaços
cantavam a chula, cantigas entre as mais conhecidas, de versos cantados até
hoje:
O raia o sol,
suspende a lua,
Olha o
palhaço no meio da rua
E o palhaço,
o que é?
É ladrão de
mulher!
A diferença
do palhaço europeu do brasileiro é que o nosso não só dialogava mas também
cantava! E cantavam eles muito bem… José Ramos Tinhorão, em seu livro, observa
que os primeiros cantores a gravarem discos no Brasil foram os palhaços de
circo. Bahiano teve a honra de ser o intérprete do primeiro samba gravado no
Brasil: Pelo telefone, de
Donga.
O
Brasil teve grandes palhaços, que não podemos deixar de mencionar e a quem
devemos apresentar nossos cumprimentos – Polydoro, cujo nome era inspirado no
General Polydoro Quintanilha Jordão; Alcebíades Pereira – que era também
exímio acrobata; Benjamim de Oliveira – o primeiro palhaço negro – exibia-se no
circo Spinelli – era negro, mas pintava a cara de branco, como faziam os
palhaços. Se Bahiano gravou o primeiro samba, Benjamim participou do primeiro
filme – baseado no Guarani de José de Alencar – ele foi o Peri.
E mais:
Eduardo das Neves, Pompílio – que não conseguiu aposentadoria, apesar das
palavras de Joracy Camargo, pedindo pensão para ele – “que obtenha dos
políticos que tanto riram com ele, a pensão a que têm direito os verdadeiros
palhaços, mais úteis ao povo que os falsos palhaços da politicagem nacional”. E
Oscarito, Grande Otelo, Mazzaropi, Fred e Carequinha, entre tantos outros que
nos deliciaram com suas representações inesquecíveis.
E, por fim,
não se pode deixar de citar a garotada que saiu de cara pintada, fazendo
barulho pelas ruas, seguindo o exemplo dos nossos palhaços. A eles, a pátria
agradece.
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