Sinopse Enredo 2016
MAGIA CIGANA
Mora, no sangue cigano,
uma porção de pássaros
expulsos do Paraíso.
Só tiveram tempo
de levar consigo:
a música e a dança,
roupas do corpo,
abrigo do espírito,
cobertor de soluços
Deus logo os chamou de volta
para alegrarem de novo as festas do céu.
(“Ciganos XVI”, Ático Vilas-Boas da Mota)
uma porção de pássaros
expulsos do Paraíso.
Só tiveram tempo
de levar consigo:
a música e a dança,
roupas do corpo,
abrigo do espírito,
cobertor de soluços
Deus logo os chamou de volta
para alegrarem de novo as festas do céu.
(“Ciganos XVI”, Ático Vilas-Boas da Mota)
Diz a lenda que o povo cigano foi guiado por um
rei até Sind, na Índia. Lá viveram tempos de plena felicidade, até sua cidade
ser destruída por uma invasão muçulmana. Então começaram sua migração, vagando
errantes pelos países e continentes. A poesia persa conta que um sultão
convocou dez mil ciganos da Índia, exímios músicos, para alegrar e entreter seu
povo. Lenda e história se entrelaçam. Sabe-se que vieram da Índia – onde seu
maior contingente era formado por uma casta de guerreiros – e partiram para a
Pérsia após uma invasão muçulmana.
As caravanas chegavam nas cidades medievais e
proclamavam a liderança de falsos nobres. Os ciganos inventavam documentos e
títulos de nobreza – eram duques, barões e condes de mentirinha – para
transitar livremente pela Europa. Afirmavam ser da corte de Sigismundo, rei da
Hungria, condenados pela Igreja a peregrinar para restabelecer sua fé. E assim
chegaram a Constantinopla, onde se dizia que ensinavam “coisas diabólicas”, ao
Peloponeso na Grécia – foram considerados sobreviventes de Atlântida! - e à
Península Ibérica. A vida nômade desses nobres errantes acabou lhes valendo o
talento para o comércio, levando tralhas e mercadorias exóticas de um lado para
o outro. Esses grandes ferreiros ficaram conhecidos no mundo todo por seus
tachos, bules, jarros e chaleiras de ferro e cobre.
Com as portas das cidades abertas, a mesma
música que encantou o sultão persa – e também a nobreza húngara, que mantinha
orquestras ciganas – cativava e a dança era uma grande atração nas festas das
cortes do Velho Mundo. No ostentoso desfile das tropas turcas para o sultão
Mourad IV, dançarinos ciganos seguiam os músicos. Nos castelos das cortes
europeias, esses espetáculos de dança eram comuns, desde os tempos de Henrique
IV na França. O próprio Luís XIV, o extravagante Rei Sol, dançou vestido de
cigano em um ato de uma peça de Moliére que incluía um grupo de bailarinos
dançando ao som de pandeiros. Através dos séculos, os ciganos desenvolveram
danças com leques, punhais, lenços e adagas. Na Espanha, o encontro entre
ciganos e árabes deu origem ao flamenco da Andaluzia, uma das danças mais
espetaculares já inventadas.
Desde o começo de sua viagem pelo mundo, os
ciganos não levaram consigo as divindades da Índia. Por onde passavam, se
adaptavam às crenças locais e incorporavam novos hábitos. Liam o destino nas
linhas das mãos, nas cartas de baralho, nas borras do café, jogos de dados e
cristais, costumes que são sua marca até hoje. Porém, os mesmos mistérios que
fascinavam provocavam medo. Se em alguns lugares os ciganos encantavam, eram
afugentados de outros, perseguidos e condenados – em alguns casos, à morte.
Arderam nas chamas da Inquisição e foram degredados para outras terras.
Escravizados na Romênia, foram vítimas do Nazismo durante a Segunda Guerra
Mundial.
No Brasil, onde os primeiros ciganos degredados
chegaram em 1574, a magia cigana foi sincretizada aos cultos da Umbanda,
através de incorporações de toda uma linha de entidades ciganas. A magia dos
olhos que decifram o futuro inspirou Machado de Assis, com sua Capitu que tinha
olhos de ressaca e “de cigana oblíqua e dissimulada”. Tiveram uma nova imagem
envolta em mistério e romance construída em novela e canção – a inesquecível
Sandra Rosa Madalena, bonita e de cabelos muito negros, com seu corpo que dança
sem parar. Não encontraram nestas terras a paz plena tão sonhada, mas
certamente seu espírito livre influenciou seus filhos a sonharem com um amanhã
diferente. Juscelino Kubitschek, descendente de ciganos, em um delírio redentor
imaginou construir em Brasília a capital de um novo tempo.
Conta a cultura milenar do povo cigano que a
Lua simboliza a magia e os mistérios, enquanto o Sol é talismã de riqueza e
prosperidade. Em sua leitura da sorte através das cartas, a proximidade do
astro-rei ilumina com seus raios banhando de fortuna o consulente e a soberana
da noite aponta para grandes honras. A gestante acaricia sua barriga ao nascer
do Sol e da Lua, num ritual diário pedindo sorte e felicidade.
Com esta mística positiva que o Sol e a Lua
trazem para todos, saudamos as forças da natureza e seus quatro elementos,
clamando por dias de tolerância, fraternidade e alegria. Como uma criança
cigana, nos banhamos em moedas e pétalas de rosa, evocando o raiar de uma nova
era. Venham, ciganos de todas as partes! A Passarela será de vocês! Façam seu
grande cortejo para Santa Sara Kali! Tragam suas vidas nas carroças, suas tendas
coloridas, seus enfeites de metal! Acendam sua fogueira, toquem seu pandeiro,
com barulho, risos, dança e brilho! Esta é uma grande noite para celebrar sua
história e sua magia! Optchá!
“Liberdade, essa palavra que o sonho humano
alimenta que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda...”
(Cecília Meirelles, descendente de ciganos)
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